Terça-feira, 14 de Janeiro de 2025
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Atentado ao património artístico no Centro Social de Carregosa

> As obras de requalificação no Centro Social de Carregosa retiraram a obra artística em azulejo que embelezava o seu exterior. E já gera polémica.
A obra em azulejo pintado à mão que exista na fachada no edifício foi tapada com capoto
A obra em azulejo pintado à mão que exista na fachada no edifício foi tapada com capoto

Inicio este artigo com uma “declaração de interesses”. Sou um Carregosense, filho de Manuel Melo. Meu pai, além de outras responsabilidades e cargos que exerceu em prol da freguesia de Carregosa, foi Presidente da Junta de Freguesia durante três mandatos e foi fundador e Presidente de Direção do Centro Social Cultural e Recreativo de Carregosa durante vários anos.

Posto isto, trago aqui parte de uma estória que transcrevi do livro “Estórias com tinta” do meu amigo Maximino Aguiar Tavares, editado em 2020:

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“Estávamos, nos anos 80, na aldeia o presidente da junta, o Sr. Manuel Melo, com defeitos e virtudes, era um homem dinâmico e sonhador. Com a sua paixão pela terra arrastava grande parte da população.

Sonhou construir um grande edifício de cariz social que englobasse valências de lar, infantário, cultura, desporto e tempos livres. À grande. Toda a gente aderiu.

A obra era absolutamente necessária. Os tempos eram difíceis, não havia dinheiro, sempre, sempre o mesmo obstáculo. Realizaram-se peditórios, sorteios, cortejos, angariaram-se sócios.

Nos cortejos realizados o primeiro a sair envolvia os lugares de Arrifaninha, Ínsua, Fontanheira, Cavadinha, Presigo e Lomba. Muito elegante primou pela harmonia, beleza, muita cor, muita alegria, muita juventude e sobretudo muitas flores. Estava dado o mote, o pontapé de saída.

O segundo cortejo seria o dos lugares de Carregosa de Cima, Serrado, Carregosa de Baixo, Chão da Silva, Costeira, Perrinho e Seada. Todos estes lugares estavam a trabalhar, apenas o de Carregosa de Cima encontrava-se completamente amorfo. As senhoras eram a mola principal, ali nem uma. O senhor Melo acendeu o rastilho: “onde não há mulheres tem de haver homens”. Na Casa Maximino reunimo-nos na brincadeira uns tantos rapazes. Conseguimos um quartel-general. Foi tudo feito numa ou duas semanas. Ideias, mais ideias, o que fazer?

Surgiu um plano, se não há mulheres vamos representá-las. Todos concordaram. Que vamos representar? Depois de muita conversa, muita reflexão, chegamos a uma conclusão: o melhor seria levar um lavadouro público. Ora nem mais. Preparámos todo o cenário que levaríamos no carro alegórico. Conjugamos em uníssono algumas sátiras…o próprio carro já era uma graçola com os rapazes vestidos de mulher. Cada um de nós dizia uma verdade e todos à uma diziam em refrão: MAS QUE MENTIRA!”

Lembro-me perfeitamente deste cortejo e decidi transcrever este pedaço de texto para que todos tenham a perceção das dificuldades que foram ultrapassadas para poderem hoje oferecer à população uma instituição como o Centro Social Cultural e Recreativo de Carregosa.

Atualmente, aos olhos de muitos, é uma instituição reconhecida que está ali implantada como um “dado adquirido”. Outros não têm noção, não conhecem e não sabem o que foi necessário fazer para ultrapassar as dificuldades para que, hoje, Carregosa tenha uma instituição que oferece inúmeras valências aos carregosenses.

O Centro Social foi fundado em 1981 tendo, em 1986, inaugurado as suas atuais instalações, tornando-se uma referência educacional na região. Uma associação sem fins lucrativos dedicada ao apoio social, educacional e recreativo.

Inicialmente focado na infância expandiu-se, em 1992, para incluir atividades de tempos livres e o apoio domiciliário a idosos no ano 2000. O sonho do lar de 3ª idade, foi sucessivamente adiado, no entanto, ainda se adquiriu terreno, iniciou-se o projeto, mas infelizmente, até hoje, não se concretizou devido a vários contratempos e outros motivos que desconheço.

Crime patrimonial

O edifício, onde está instalado o Centro Social e que tanto custou a erguer, em frente à Junta de Freguesia, bem no centro, foi recentemente objeto de obras de requalificação, o que é perfeitamente natural num edifício com quase 40 anos. O que não acho nada natural, acho mesmo um crime patrimonial, é terem tapado com capoto a parede exterior de azulejo pintado à mão que existia na fachada do edifício.

A obra artística em azulejo que embelezava o exterior do Centro Social de Carregosa

Na minha opinião considero um atentado ao património da instituição e, ao mesmo tempo, considero um desrespeito total pelos carregosenses que fundaram e ergueram a Instituição, pelo benemérito que pagou a obra de arte que durante anos embelezou a parede exterior do Centro Social e Cultural de Carregosa. Não sei quem são os responsáveis pela infeliz decisão, e também não sei se é possível voltar a recuperar os azulejos, mas se for possível, deveriam fazê-lo imediatamente com um pedido de desculpa ao povo de Carregosa.

Não sei quem são os responsáveis pela infeliz decisão, e também não sei se é possível voltar a recuperar os azulejos, mas se for possível, deveriam fazê-lo imediatamente com um pedido de desculpa ao povo de Carregosa

A instituição tem, atualmente, cerca de 217 utentes que frequentam diariamente os serviços do Centro Social, com foco no desenvolvimento harmonioso das crianças e no apoio domiciliário a idosos. Não tenho dúvidas de que o Centro Social, no seu dia a dia, continua na busca dos seus principais objetivos, ou seja, do desenvolvimento Integral, da autonomia, da aprendizagem significativa, do bem-estar e segurança, da inclusão e da igualdade. Aliás, é de salientar os projetos premiados como “Folhas & Bichos” que exploram a natureza e promovem o desenvolvimento integral, o “Intergerarte” que promove a interação entre crianças e idosos e o “Senta-te comigo”, que aproxima gerações diferentes e promovem experiências intergeracionais.

O Centro Social e Cultural de Carregosa, desenvolve outras atividades que visam o desenvolvimento e o bem-estar social e é, sem dúvida, uma mais-valia importantíssima para a comunidade local, sendo de louvar quem abraça a missão de gerir e melhorar esta casa.

No entanto, existem aspetos que devem ser preservados como o património artístico, esteja ele onde estiver.

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