Uma equipa da Universidade de Aveiro (UA) descobriu que as escolhas alimentares do pai, desde o nascimento até à conceção de filhos, desempenham um papel crucial na saúde e no desenvolvimento dos seus descendentes. Assim, não são apenas os hábitos alimentares da mãe, antes e durante a gravidez, que influenciam a saúde dos filhos no futuro, mas também os dos pais.
A equipa responsável por esta investigação descobriu que os hábitos alimentares do pai alteram as informações (epigenéticas) presentes nos espermatozoides que, aquando da fecundação, são transmitidas para a próxima geração. Ou seja, as escolhas alimentares do pai (mais concretamente uma dieta rica em gordura, mesmo que apenas até à idade adulta), alteram a informação que o espermatozoide transporta aquando da fecundação, alterando a saúde metabólica e reprodutiva da sua descendência, até aos netos.
Ficou ainda comprovado que as – más – escolhas alimentares do pai podem aumentar também o risco de distúrbios metabólicos, como diabetes e obesidade dos seus descendentes. Parece, então, que não só “somos o que comemos”, como “os nossos filhos também são o que nós comemos”.
Sendo este um estudo transgeracional, por motivos éticos, não foi feito em humanos. Deste modo, foi utilizado inicialmente um modelo animal e posteriormente amostras de espermatozoides humanos para validar a presença de biomarcadores que, em modelos animais, estavam associados ao desenvolvimento dos problemas de saúde descritos acima.
Esta investigação resultou, após a sua conclusão, num convite para a publicação de um artigo na Nature Reviews Urology, uma conceituada revista de elevado impacto do Grupo Nature, intitulado: “Impacto dos hábitos alimentares do pai na saúde da descendência“.
O artigo, escrito por uma equipa liderada pelo investigador Marco Alves, do Departamento de Ciências Médicas (DCM) e Instituto de Biomedicina (iBiMED) da UA, em colaboração com Pedro F. Oliveira e Rita Ferreira, do Departamento de Química (DQ) e do Laboratório Associado para a Química Verde (LAQV@REQUIMTE), também da UA, discute as descobertas recentes e evidências científicas que destacam a influência dos hábitos alimentares paternos sobre a saúde futura dos filhos.
A publicação deste artigo científico de elevado impacto reconhece o trabalho que a equipa tem desenvolvido nos últimos anos, particularmente descrevendo de que modo a saúde metabólica dos homens, desde o nascimento, influencia diretamente a qualidade da sua reprodução na idade adulta.
Esta investigação contou com a colaboração da Universidade do Porto e alguns dos estudos originais tiveram também a colaboração da Universidade de Turku, Finlândia e da University College de Londres, Reino Unido.
O grupo coordenado por Marco Alves submeteu recentemente à Fundação para Ciência e a Tecnologia um projeto que visa expandir estes estudos para outros comportamentos de estilo de vida e desenvolver uma plataforma de identificação dos biomarcadores agora estudados nos espermatozoides, sem os inviabilizar, para utilização em tratamentos de fertilidade.
Marco G. Alves é licenciado em Biologia pela UA e doutorado em Bioquímica pela Universidade de Coimbra. Atualmente é Investigador Principal no DCM/UA. A sua investigação aplica tecnologias ómicas para o estudo de diferentes patologias, particularmente infertilidade masculina. Já publicou mais de 200 artigos científicos e a sua investigação já foi premiada mais de uma dezena de vezes. É inventor de duas patentes. Serve como membro de corpo editorial em mais de 15 revistas científicas. Nos últimos anos tem sido incluído na lista dos dois por cento de cientistas mais citados do mundo, de acordo com um estudo da Universidade de Stanford.